16 de mai. de 2007

"No creo en brujas, pero..."

Chineses são obcecados com superstições. Há umas engraçadas e várias, non-sense.

Números
Aqui, cada algarismo tem seu significado. Alguns são considerados positivos e atraem sorte. Outros, negativos, acarretam desgraças. O quatro – escrito 四 e pronunciado “” – é fatídico, porque soa como “morte” (死, “”). Rejeitado. Prova disso são os números de telefone com 4 bem mais baratos que os demais. Ou maioria dos prédios, que não tem determinados andares: 4°, 14°, 24°. Já o oito (八), pronunciado “”, é o campeão da preferência nacional. Rima com (“”, 发), que significa “ficar rico”. Na província de Guangzhou, no sul do país, celulares terminados com 8 são disputados a tapa. Podem chegar a custar até 5,000 yuans (uns 1.300 reais) a mais! O seis (六, “liù”) também é querido porque lembra (“”, 禄), que significa, a grandes rasgos, algo como “desfrutar da vida com dinheiro e alegria”. O nove (九, “jiǔ”), idem. Além de homônimo de 久 (“jiu”, perpétuo) – e, portanto, cifra da eternidade – é o número mais alto. Encarna supremacia. A arquitetura dos palácios antigos tinha sempre estruturas de nove – ou múltiplos de nove – pra ressaltar essa tal posição soberana dos reis e imperadores.

Cores
Cores igualmente ostentam personalidades próprias. Branco é a cor da morte. Amarelo, do paraíso – assim como a cor da roupa do imperador (filho do paraíso) e dos tetos dos templos. Vermelho, hours concours, significa sorte e prosperidade. Além de preencher a bandeira nacional, colore calcinhas e cuecas no dia de ano novo chinês. Os mais supersticiosos, aliás, se estocam de underwear vermelha pra passar o ano (inteiro) deles (ano do zodíaco chinês, digo), vestindo a cor favorita - dia após dia! Noivas chinesas tradicionais também se casam de vestido vermelho (embora já haja muitas que, globalizadas, preferem adotar o look ocidental, todo em branco).

Casamento
O tema 'altar' é pleno de crenças. Em determinadas províncias do interior, companheiros 3 ou 6 anos mais novo, assim como 3 ou 6 anos mais velho que a cara metade não podem selar o matrimônio. Dá azar. Ao mesmo tempo, aqui em Pequim, acredita-se no contrário: a combinação noiva-três-anos-mais-velha-que-noivo é muito boa; traz dinheiro para o casal. Antes de passar pelo vicário, os casais também se asseguram de que um menino (qualquer um: o sobrinho, o filho da vizinha, o neto da empregada) sente-se no leito matrimonial (os mais exagerados até fazem o garoto dormir uma noite lá, sozinho) pra garantir que trarão ao mundo um rebento macho (uma predileção absoluta na China, como bem se sabe mundo afora).

Gravidez
Outra “estratégia” adotada pelas mães chinesas para gerar meninos é comer tofu, cogumelo, cenoura e alface. Para ter meninas, picles, carne e peixe. E, ah!, uma vez grávidas, elas não podem uma série de coisas, como martelar pregos – que causaria deformações no feto –, usar colas ou materiais adesivos – propiciaria um parto difícil –; falar palavrão – amaldiçoaria o bebê –; ou andar descalça (não sei por que, sinceramente). Quando dão à luz, não recebem visitas de estranhos durante os primeiros meses. (fato verídico: uma conhecida, estrangeira, acabava de voltar do hospital e precisou de uma ajuda extra pra poder tomar água. O entregador do mercado se recusava a pôr os pés na casa porque sabia que ela acabava de ter um filho). E, ah!, o aspecto físico dos recém-nascidos também diria muito sobre a personalidade deles: “Cabeludos serão desobedientes”. “De orelhas grandes e grossas, viverão uma existência próspera”.

Nascimento
Um detalhe crucial sobre rebentos é quando pari-los. Podendo escolher (e os chineses, de fato, escolhem!) programa-se a data para um ano favorável. Este ano – do porco dourado – é uma maravilha. Combina um animal ok e um elemento ideal, o ouro. O ano do dragão, idem. É sempre um bom ano: as taxas de natalidade costumam duplicar nesse período. Já anos de ovelha e tigre são menos populares. Ovelha porque costuma ser associada à submissão, fragilidade. E tigre porque é considerado um animal violento, que caracterizaria pessoas de personalidade difícil. A exceção – machista como manda a tradição local – é feita no caso dos meninos-tigre. Se machos, ok. Agressivos, mas “valentes”, “enérgicos”, “viris”. Agora: meninas-tigre.... Ui, ui, ui... Uma maldição em família. Na China, o ideal feminino ainda é uma mocinha recatada, obediente e bonitinha.

Nomes
Coisa, aliás, que se vê muito pelos nomes chineses. A alcunha do povo aqui quer dizer bem mais que um mero chamativo. Cada nome leva impressa a expectativa dos pais em relação aos seus herdeiros. Entre os masculinos, por exemplo, abundam adjetivos varonis como 勇 "Yǒng" (corajoso), 亮 "Liàng" (brilhante), ou substantivos pesados do naipe de 军 "Jūn" (exército). No campo feminino, imperam as amenidades: 丽 "Lì" (bonita), 欣 "Xīn" (alegre) ou 悦 "Yuè" (também alegre, feliz). Fico imaginando o trauma que isso deve gerar quando a criança cresce e não é exatamente tão “lì”, ou tão “liàng” como se esperava...

Aniversário
No dia de soprar velinhas, além do ritual cantado em chinês (“Zhu ni sheng ri kuai le...”), os chineses fazem questão de que você coma cháng shòu miàn (o “macarrão da longevidade”: 长寿面) – que pode, na verdade, ser qualquer macarrão ao estilo noodles, contanto que seja longo. Quanto mais comprido, melhor. Sabe o nosso tradicional desejo de “muitos anos de vida” ao aniversariante? Aqui, eles desejam o mesmo de uma maneira mais criativa: “Que sua vida seja tão extensa como esse macarrão!”. Pra não fazer feio, em tempo: é mal-educado abrir o presente assim que recebe ("porque, se você não gostar, não precisa dissimular" - a honestidade da minha professora!). Não se deve embrulhar o presente em papel branco (a cor da morte, lembra?). Nem é recomendável presentear as pessoas com relógios ("porque remete ao fim"). E, em família, também rola um carinhoso ovo cozido no café da manhã. Presente que os aniversariantes, hoje em dia, podem não apreciar tanto, mas surgiu em épocas passadas, quando o país sofria a fome.

Ano novo chinês
Tão importante como a celebração do dia do aniversário do sujeito é o início do ano dele no zodíaco. A virada do “ano novo chinês” (que oscila entre 20 de janeiro e 18 de fevereiro, de acordo com o primeiro dia de primavera no calendário lunar) é a data recorde em questões supersticiosas. Não há ocasião mais cheia de recomendações e proibições. Exemplos: não varrer o chão no dia de ano novo chinês - isso varreria sua sorte pelo ano todo; não cortar o cabelo durante o primeiro mês - morreria o tio materno (coitado do barbeiro!); não dar bronca ou castigar as crianças - porque, se elas começam o ano chorando, chorarão o ano todo. Na lista do “deve”, comer um peixe inteiro - porque a palavra “peixe” (鱼, pronunciada “”, da mesma maneira que “extra” (余)) simboliza fartura... aliás, repare: muitas pinturas chinesas têm peixes como destaque. É o típico quadro – cafona – que eles fazem questão de pendurar na parede da sala. Outra regra é espalhar o símbolo 福 (“”) – felicidade – pela casa. Sempre em pedacinhos de papel vermelho. E sempre de cabeça pra baixo, porque o mesmo símbolo, invertido, significa “chegar”. E, na lógica chinesa, 1 + 1 = 2 e “” de ponta cabeça quer dizer “a felicidade chegou”!

Pout pourri
de pirações chinesas
Estranhas, mas habituais por aqui, também são as manias de deixar sempre um restinho de comida no prato “pra ter o que comer no futuro”; bater na porta do quarto de hotel (vazio!) "pra demonstrar respeito pelos espíritos que habitam o local"; dar descarga assim que fizer o check in "pra mandar embora as más influências"; andar sempre com uma pedrinha de jade - aquela verde, preciosidade em abundância na China. Custa caro, mas todo mundo que se preza por aqui ostenta um bracelete, um brinquinho, um pendente no cordão, qualquer coisa com jade. Acredita-se que jade traz fortuna e espanta os maus espíritos. E mais: a cor da jade pode variar com o tempo. Claaaaaaaro que os chineses têm uma interpretação para cara ocorrência: Se a sua escurecer, você ficará rico. Se clarear, ficará pobre. (percebeu a obsessão com dinheiro?!)

No ramo ‘decoração do lar’, nem vou entrar. Basta lembrar que o feng shui foi criado pelos chineses e é levado muito a sério por aqui.

E as coisas que você não pode fazer nem em sonhos? Depois de um enterro, voltar diretamente pra casa. "A alma do morto pode te perseguir". Durante a refeição, espetar os pauzinhos na comida. "Isso recorda os incensos acesos aos mortos". Apoiar a chaleira na mesa com o bico apontado pra alguém. "Faz entender que você tá desejando a morte dela". Cortar as unhas à noite. Atrairia fantasmas (por que será? Fantasma chinês gosta de chulé?). Deixar as meias ou os sapatos ao lado da cama, durante a noite. Ajudaria aos maus espíritos a te encontrarem. Usar calcinhas ou cuecas com seu nome. Pela mesma razão: "os fantasmas já saberiam como te chamar" (só ficou a dúvida: Eles lêem em qualquer idioma? E quando vêem “Calvin Klein” na cueca? Se confundem?). Presentear o(a) namorado(a) com sapatos. "Eles (os sapatos) poderiam ser usados pelo ser amado para fugirem de você" ( cruel!). Usar bigode. "Dá azar". De fato. Responda rápido: Quantos chineses você já viu de bigode por aí?

3 Comments:

At 22/5/07, Anonymous Anônimo said...

Estou amando tanta novidade... ; )
Bjs com saudades.

 
At 22/5/07, Blogger Helena said...

Wow! Que aula. Adorei.

 
At 23/5/07, Anonymous Anônimo said...

Achei a parte do bigode legal. Não gosto de homem de bigode! Menina, fiquei boba com tanta informação. Esse país é de fato estranho, hein! To com saudades! beijos!

 

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