29 de mai. de 2007

VIPs sequestrados

Da séria ‘só aqui na China’. Quem anda atualizado sobre Pequim sabe que está na moda o restaurante/bar/lounge Lan, do cultuado designer francês Philip Starck. Descrição rápida: Bem nouveau rich, o local ostenta 6.000 metros quadrados de uma decoração “peculiar”, que vai de pinturas a óleo a uma cabeça de rinoceronte, passando por móveis barrocos, luminárias Baccara e cadeiras de 25.000 dólares (cada) feitas por 10 artesãos (cada) durante um mês (cada). Como clientela, pessoas que se consideram a fina flor do jet set local.

Pensando em ver como essa fauna se comporta ao vivo, resolvemos celebrar o aniversário de um amigo italiano – de passagem pela China – lá. Era um jantar. Reservamos a mesa com uma semana de antecedência. E, no dia marcado (sábado), comparecemos.


Já na chegada, a coisa começou a parecer estranha. Antes d’eu encontrar o porque de um homem uniformizado ter vindo correndo abrir a porta do carro, já estava pisamos num looooongo e chamativo tapete vermelho, onde uma fila de mocinhas vestidas em traje de gala, dava “boa noite” (em inglês!) pra gente. Enquanto a horda de fotógrafos ia iluminando nosso caminho com flashes (foram definitivamente nossos 15 segundos de vida hollywoodiana), o aniversariante pergunta: “Vocês montaram essa sacanagem de propósito?”.

Na verdade, não. “É que hoje estamos tendo uma festa privada da Mercedes-Benz e da Grey Goose”, explica o rapaz da recepção, depois de se desculpar por não ter conseguido nos localizar pra antecipar a notícia (o telefone da reserva era o meu celular – que costuma ser ignorado durante o fim-de-semana). Feliz, ele avisa ainda que, como compensação, nos fez um “upgrade”. Ao invés do restaurante – onde o serviço a la carte tinha sido suspendido por causa do coquetel –, fomos destinados a uma sala vip reservada. Caras de bunda.

Se fôssemos chineses, estaríamos provavelmente radiantes com a notícia (porque, aqui na China, é chiquérrimo isso de comer em áreas reservadas). Mas, prontos pra ter uma experiência antropológica em meio aos novos ricos chineses, aquilo soou mais como um balde de água fria. Só não amargamos a decepção porque a fome era maior.

Sim. A sala onde nos colocaram era impressionante (especificamente uma dessas aí acima, na foto). No centro, uma mesa redonda, ao estilo medieval, com uns 2 metros de diâmetro. Ao redor, cadeiras – cada uma de um estilo diferente – todas com estofados de veludo e encosto alto. Coisa de monarca. As paredes, com cortinas e obras de arte. Uma espécie de pot-pourri de objetos de brechó – só que limpos, novos e com a assinatura Starck.

A comida? Medíocre. E o serviço, curioso. Menos mal que o vinho fez efeito. Passamos umas duas horas dentro daquela sala e sempre havia um chinês – com um sorriso estampado na cara (parecia que tinha levado um choque) – parado, como um dois de paus, esperando pelo seguinte comando. Você mal apoiava o copo na mesa, e eis que lá estava a mão do sujeito, esperando pra repor a bebida. Ele não entendia muito do que se dizia lá dentro. A frase-chave do rapaz era “sorry, my English...” (sim, com reticências no final). Devia estar achando uma aberração: quatro idiotas que se dobravam de rir com coisas que, para ele, pareciam absolutamente triviais. Pedimos pão (que precisou ser explicado com mímica, paciência, e várias repetições de leitura labial). Entender? Sim, ele entendeu. A palavra. Porque o conceito passou longe. O pão, que deveria ter vindo junto, ou antes da comida, com óleo e sal, sei lá, chegou no final de tudo. E era pão de forma (!!!!). Branco. Cortado em triangulos. Acompanhado de manteiga e marmelada. E apresentado como... sobremesa?!


Nem sei. Depois de ter visto as luzes irem diminuindo, diminuindo, até quase apagarem, no meio do jantar (situação prontamente seguida da aparição instantânea de outro chinês com sorriso estático que repetia "sorry, sorry") e ter comido com a sensação de estar participando de um reality show, já não fazia a menor diferença.


Rimos muito de tudo aquilo, ok. Mas, finalizado o festim, queríamos ver gente!!! Quando já estamos saindo da salinha 5 estrelas – nós, as mulheres, munidas de bolsa e batom –, eis que o chinês do sorriso estático nos freia e começa a indicar o caminho de volta. “Não, moço, eu quero sair”. Não podia. E o homenzinho, muito orgulhoso, nos mostra que dentro da ‘super sala’, a cortina escondia mais que obras de arte. Tinha um banheiro privativo! Desnecessário comentar o patético da situação. Ninguém estava, de fato, interessado em banheiro algum (mesmo que aquele – ¿como no? – fosse um autêntico toilete Philip Starck, cheeeeio de enfeites, uma privada refinadíssima, toalhinhas afrescalhadas, espelhos ao estilo Branca de Neves e o escambau). Entre tentar conter o acesso de riso (convenhamos: era tudo muito esdrúxulo pra um mero jantar) e não querer ferir os sentimentos do nosso garçom-anfitrião chinês, dissimulamos, conferindo o novo cômodo. Um dos presentes ainda emenda: "E se a gente subornasse esse cara pra ele nos deixar usar o banheiro de serviço? No caminho, a gente gastava o outfit, né?!".

Enquanto isso, o chinês, na posição onde estava, não via o que fazíamos lá dentro. Só escutava as risadas. Devia estar pensando: "Esses ocidentais são bem estranhos mesmo. Até vão juntos ao banheiro!".


No fim das contas, sim, conseguimos nos livrar do nosso cativeiro de luxo e nos juntar aos “mortais”. Mas não deu pra ver nada. Já era tarde e tínhamos que estar em outro bar, logo depois.

Pois é. Continuo sem saber como se comporta a fauna local. Por ora, só consegui dar a eles a oportunidade de ver quatro estrangeiros bancando os trapalhões.

3 Comments:

At 29/5/07, Blogger Unknown said...

que sitio mais raro, Pasarais moito medo, verdade?
Gosto moito do teu blog.

 
At 29/5/07, Blogger Unknown said...

Ha ha ha! Adorei. Não connhecia o lado "vip" dos chineses...

Beijos e saudades,
Cris

 
At 30/5/07, Blogger Unknown said...

HHAHAHAHAHAHHAHAHAHAHAHHAH... Hilário mesmo!!!!!!!!
Beijo....

 

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